- Você acredita em Deus?
- Por que a pergunta agora?
- Eu perguntei primeiro.
- Ok, mas minha pergunta precede a sua, pois refere-se ao que você pensava antes de perguntar...
- Não entendi.
- Esquece. Eu respondo à sua pergunta. Você quer saber se eu acredito em Deus? Bem, às vezes.
- Às vezes?
- Sim, em momentos específicos, mas raros. Por exemplo, se você apontar uma arma para a minha testa, é possível que a idéia me ocorra por alguns segundos.
- Então você só pensa em Deus quando está desesperado?
- Ás vezes quando olho para uma flor...um animal bonito...tenho certeza de que Deus não existe.
- "Não existe"?
- Deus não criou o rio. Criou o homem que caga no rio, na melhor das hipóteses
- À Sua imagem e semelhança.
- Amém.
- Mas não poderia ele ter criado ambos?
- A possibilidade sempre existe. Mas sinceramente acho tão imbecil estar vivo e gastar tempo pensando no além quanto um cadáver no túmulo alimentar pensamentos sobre uma bela tarde de verão.
- Eu diria que as tardes de verão só parecem belas porque o resto dos dias de verão são um inferno, mas estaria falando como você falaria.
- Estamos nos fundindo.
- Vou falar de mim.
- Que mentira o nosso diálogo.
- Qualquer diálogo.
- Você não prestou a menor atenção no que eu disse...
- Nem uma palavra.
- Simplesmente fingiu ouvir, educadamente esperando a hora de vomitar suas próprias idéias.
- Posso falar?
- Pode, mas não vou estar ouvindo.
- Eu não acredito em Deus. Mas acho que deva existir algo como o Supremo Diretor.
- Supremo Diretor?
- Você está ouvindo?
- Impossível evitar. Não há como fechar os ouvidos.
- Supremo Diretor. Acho que o universo é uma espécie de empresa, comandada por alguém em um gabinete.
- Supremo Diretor...sei...e o que produziria essa empresa?
- Nada. Eu ia dizer "mitos", mas achei que você riria de mim.
- Sim, eu riria. Nenhuma conversa que tenha a palavra "mito" é levada a sério por alguém que não seja um completo imbecil.
- Como qualquer organismo, essa empresa tenta se manter viva. Talvez para afastar a terrível idéia da possibilidade de não passar de poeira na ponta do rabo de um animal idiota em outra dimensão.
- O animal mais idiota não tem rabo.
- Ou talvez seja todo rabo.