Tuesday, September 07, 2010

Ficou cansado de procurar, ainda que o fizesse meio sem perceber. Um clic quase inaudível causou a mudança de atitude, se é que era uma mudança de atitude. Se não foi uma mudança de atitude, foi mais como ajeitar o corpo sobre uma cama de pregos, buscando um pouco mais de conforto. Uma jovem de elegância discutível contou uma piada e o pobre homem a levou um pouco a sério demais, como assim? Ele se pegou imaginando as dimensões do bigode do português ou a penugem do papagaio e já não tinha idade para isso, convenhamos.
Ficou cansado de estar cansado, levantou da cama de pregos e mandou o mundo se foder. Como de costume, o mundo repetiu em eco. A vida não é surpreendente, infelizmente. A maior parte dos fenômenos é cíclico e obedece às leis estúpidas da probabilidade, da matemática, abstrações vis. Relógios. Ele se apaixonou uma vez por uma mulher que era igual a um relógio. Ele olhava para ela e sentia cada segundo passando por sua carne, ele envelhecia cada vez que ela dava uma volta, vestida só com as suas roupas de baixo, pela casa.
Ficou parado de frente à janela, esperando. Cansou de esperar. Já ia ficando cansado de estar cansado de novo, quando o telefone tocou, mas ele não atendeu. Quem quer que fosse, ele já sabia o que diria. Palavras falsas de apoio, na verdade conselhos que não havia pedido jamais. Ele não queria mudar. Ele estava exatamente onde queria, com as roupas que queria. Se ele mudasse, os outros venceriam, supondo que essa merda fosse um jogo mesmo, como os mais idiotas gostam de repetir.
Sim, porque os mais idiotas às vezes estão certos. E idiotice é uma questão de perspectiva: eu, ao contar essa história, por exemplo, estou tentado a achar que o idiota é ele. Sempre é ele, mesmo diante do espelho, mesmo debaixo do chuveiro disfarçando as lágrimas, mesmo diante do tédio que gira, gira, gira, gira.

Monday, September 06, 2010

Porque foram as mulheres que me ensinaram o que é a solidão.

Wednesday, July 28, 2010

Assim Falaram

- Não é possível que você se divirta aí sozinho fechado no quarto.
- Não é possível que você goste tanto de música.
- Não é possível que você não goste de feijão.
- Não é possível que você coma tão pouco.
- Não é possível que você seja amigo de suas ex.
- Não é possível que você goste mais de gatos do que de gente.
- Não é possível que você não fique puto "nessas situações".

Ok, admito, eu sou impossível.

Tuesday, July 27, 2010

Ela veio até mim, bonita como sempre, mas eu sentia que a beleza já não era para mim. Que inferno. Voltar ao tédio. Ela disse:
- Esse negócio de namoro é um saco.
- É verdade, o que a gente faz?
- Ah sei lá...
- É que eu pensei que era o que você queria...
- Tudo bem.
- E agora?
- A gente repassa a lista de nossos amigos e vê quem é mais pegável?
- Ok.
- Quer mais uma coca?

Sunday, July 25, 2010

Mentiroso

Começou com um cigarro. Ela acendeu um cigarro lentamente, com a precisão de um torturador da Inquisição e começou a falar. Eu interrompi, porque aquilo estava começando muito errado, muito mal.
- Mas você não fuma!
- Não, meu bem, eu fumo. Eu sempre fumei.
Estaria eu enganado sobre os discursos inflamados a respeito dos malefícios do cigarro? Estaria ela se aproveitando do pouco que confio na minha própria memória?
Como eu dizia, ela começou a falar.
- Preciso dizer umas verdades. Você aguenta?
- Se doer demais, eu grito. Algo assim.
Enquanto tirava a peruca, revelando longos cachos loiros, a ex-morena que eu amei meio antes da hora falou, ressoando na noite, metálica.
- Não era amor, não podia ser amor, o amor costuma levar um pouco mais de tempo, segundas estatísticas universalmente comprovadas...
- Me poupe dos números.
- Ok, disso posso te poupar. - disse enquanto tirava as lentes, revelando um olho de cada cor. - Claro que usei a palavra amor, mas precisava me garantir de que, na hora exata, seria eu a finalizar o processo. Foi preciso ter certeza de que eu não seria a pessoa mais envolvida...é complexo. Posso cantar uma música do Nelson Cavaquinho que...
- Não, não, não cante. - Eu quis dizer que ela era uma péssima cantora, mas por uma razão, não consegui. Sou péssimo com a sinceridade.
Tive a impressão que seus dentes cresciam ou diminuíam, mas ao menos ela não cantou.
- As conversas me mataram de tédio, quase. - Das mãos estranhamente finas surgiram dois mínúsculos fones de ouvido, que ela usava nas ocasiões em que eu, excitado demais, expunha as minhas "ideias". Aspas dela.
- Suas "ideias" faziam com minha paciência o que seu pau devia fazer com meu corpo. E o sexo era ruim. Se eu disse o contrário, foi só porque se já era insatisfatório com meu apoio, que dirá sem ele. Mas o pior de tudo era o beijo.
- É, três mulheres já me disseram que beijo muito mal, e três mulheres não podem estar erradas.
- Não estamos. Não foi divertido. Você desperdiçou meu tempo.
Eu disse que gritaria, mas sei lá. É isso, sei lá. Não sei. Não sei o que deu em mim.
Ela me olhou, sem pena, com a curiosidade de uma criança que prende um inseto num pote para que ele...morra, porra, para quê se prende um inseto num pote?
- Tudo bem?
Menti.
- Você me odeia?
Menti.
- Não sei bem para que serve a palavra, mas podemos ser amigos?
Menti uma terceira vez, enquanto ela removia a perna direita por um modelo mais fino e moderno.
Aquela mulher que era outra achou por bem terminar o assunto e seguir seu caminho, levando sua sinceridade.
Eu fiquei com uma mentira débil nas mãos no meio da madrugada.

Quando ela me perguntou se eu havia escrito isso para ela, respondi com minha última mentira.

Wednesday, July 14, 2010

Eu Mesmo

Me lembro da primeira vez em que raspei totalmente a cabeça, ainda tinha um resto de cabelo que insistia em crescer. Eu fui à casa dessa menina que eu estava tentando convencer, sem sucesso, a me ceder seus favores, eu com 22 de idade, mais ou menos, ela com menos. Lembro da perplexidade nos olhos dela, "Por que você fez isso?".  Naquele tempo, quando me faziam esse tipo de pergunta, eu tentava responder, achando que era isso o que as perguntas exigiam. Não sabia que algumas perguntas são, na verdade, exclamações disfarçadas.
Eu vinha de uma longa e árdua luta com meu cabelo. Nunca soube o que fazer com ele, sempre achei que os diferentes cortes que eu tentava me deixavam com uma cara que não era a minha, ou pelo menos não a cara que eu gostaria de ter. Quando me livrei dele, achei o resultado mais simpático, mas isso ainda é a menor das razões. O grande encanto de ser careca adveio da imensa praticidade. Nunca mais pentear o cabelo.
"Você não pode estar falando sério", ela disse. Eu estava. Vem de longe a minha sina de ser levado a sério quando estou brincando e vice-versa. É o que eu chamo de grave problema de comunicação, deve ser algo nas minhas palavras e meus gestos. Por isso procuro ser o mais direto possível, jamais vou escrever poesia (por falta de talento também), me irritam os textos muito intrincados, eu conheço os riscos da incompreensão.
Entendo a incompreensão. É difícil para mim, entender como as pessoas se deslumbram com valores fúteis. É complexo aceitar a opção por uma vida sedada por ilusões diversas (Deus, amor, drogas, política), quando a meu ver, não há como fugir da realidade, exceto pela morte. Lembro de uma garota que conheci (com essa tive alguns avanços, mas sinceramente lamento o ocorrido), que não conseguiria sair de casa se o cabelo estivesse ruim, mesmo em caso de incêndio. Isso não faz o menor sentido para mim, mas, quem morreria queimada seria  ela, logo...
Tudo se trata de prioridades. Como aquela outra que alegava que eu me "expunha demais no blog". Me exponho para quem? Quem lê essa merda? Estou me queimando ao dizer que perdi a virgindade aos 21 anos? As pessoas não vão querer ir para a cama comigo depois disso? Eu quero ir para a cama com imbecis que concluiriam isso? (Não, abandonei esse hábito lá pelos 26 anos mesmo. Mesmo que disfarce bem, uma mulher imbecil vai demonstrar sua imbecilidade em algum momento, às vezes durante o sexo. Além do mais, sexo dura muito pouco e uma das piores sensações pós-orgasmo é desejar que a parceira desapareça por completo da face do universo).
Temendo que esse post seja eterno, me forço a parar por aqui e voltar a assistir ao excelente documentário sobre Robert Crumb, que estava me emocionando bastante. Façam o mesmo, não percam seu tempo com esse blog fútil ou com outras futilidades mil, porque a vida é curta demais e as coisas boas geralmente duram segundos, crianças.

Saturday, June 26, 2010

Eu bebia uma cerveja qualquer num bar qualquer de uma cidade qualquer porque eu era um qualquer. Um homem tem que saber o seu lugar e eu morro de medo de sair do meu. É muito deselegante se enforcar na sala de estar de alguém que você mal conhece, sabe, coisas assim.
Esperava e esperava por uma mulher que andava dizendo que gostava de mim. A história havia me ensinado que às vezes vale a pena esperar e agora parecia uma dessas vezes. Ela ficava tanto vestida de branco quanto de preto, o tipo de mulher com quem se deve ter muita cautela. Ela sempre se atrasava, mas essa noite talvez estivesse tentando bater algum recorde.
Juro que comecei a prestar atenção no casal da mesa ao lado por puro tédio. Detesto esperar, mesmo mulheres que ficam bem de branco e de preto. Quando ouvi a frase que a mulher da mesa ao lado disse de modo seco na direção de sua companhia, pressenti diversão.
- Precisamos conversar.
Todos sabemos que grandes tragédias da humanidade já começaram com essas palavras e a tragédia alheia sempre é entretenimento. Só então dei uma olhada no homem que a acompanhava, tentando ler na sua expressão meio idiota o efeito daquelas palavras. Ele pareceu confuso, meio assustado, meio puto, mas nunca se sabe. Talvez estivesse contando as horas para sair dali e se enfurnar no puteiro mais próximo. Talvez caminhasse por uma hora e meia em silêncio até em casa e chorasse no banheiro como um bom macho educado. Talvez passasse a noite tentando argumentar com a mulher. Qualquer coisa inútil.
Diminuíram bastante o tom da conversa, talvez percebendo a minha invasão de privacidade. Eu disfarcei mal, mas não precisava ouvir as palavras. Era uma conversa banal na qual uma das partes de uma relação amorosa tenta educadamente explicar a outra que as coisas não vão mais ser como eram. Eu já estivera nos dois lados da mesa, de certa forma, sabia quase de cor as falas de ambos os personagens.
Em algum momento o homem levantou e foi embora meio cabisbaixo. A mulher ficou e terminou seu copo com alguma bebida escura. Eu quis dizer duas coisas, uma para cada um deles.
Para ela: Alguma cantada barata.
Para ele: Um conselho mais barato ainda. Sempre acaba bem. Ela voltaria para ele. Ou não e ele esqueceria dela. Só há finais felizes, meus caros.
Não disse nada. Preferi chegar em casa e escrever um conto ou qualquer coisa assim. Logo me ocorreu também que a mulher que eu esperava já deveria estar chegando, em algum momento isso teria de acontecer. Ela chegou vestida de cinza, não ficava mal assim.
- Precisamos conversar - eu disse.
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