Wednesday, March 28, 2007

O Professor Mais Feio da 505

Chegando hoje na escola em que trabalho,(sim, sou professor da rede estadual e de um município do Rio de Janeiro) qual não foi minha surpresa quando fui recebido por alguns alunos da quinta série, muito mais sorridentes que de costume. Traziam novas. Eu havia ganho um concurso realizado por eles no dia anterior e agora poderia carregar feliz a faixa de professor mais feio da 505.
Dizem que sempre podemos contar com as crianças quando queremos sinceridade. Então é por isso que as mulheres ficam assustadas quando sento ao lado delas no ônibus? É por isso que os seguranças d as Lojas Americanas me escoltam pela seção de cds? Mas minha mãe semp re me disse o contrário, poxa. Peraí, quando foi a última vez em que ela disse algo parecido? E também, mãe não conta!
Então eu sou feiosão. E descobri isso definitivamente graças à "sinceridade pura" dos meus alunos monstrinhos. Legal.
Na próxima reunião com minha milícia particular, vou sugerir uma mudança nas diretrizes: Crianças primeiro!

Wednesday, March 21, 2007

3 Tomates Iam Atravessar A Rua

3 Tomates iam atravessar a rua enquanto conversavam sobre o inexorável vazio da existência. Não olhavam para os lados porque, ao contrário do que dizem todas as mães, mesmo as dos tomates, nem sempre é preciso olhar para os dois lados. Há ruas que só levam para um lado e até há ruas que não levam a lugar algum. São ruas fracassadas, deram errado e acabaram em algum muro. Caso sua mãe lhe diga para não dirigir um carro a 190 km/h numa dessas ruas, leve a sério.
Eram 3 tomtes iguais. Era anti-natural vê-los assim, com a mesma opinião, os mesmos valores, gírias, gosto musical, o mesmo vermelho insosso. Sentiam-se extremamente orgulhosos de serem tão parecidos. Não padeciam da doença da originalidade. Sentiam-se extremamente orgulhosos de serem tão parecidos e até seu orgulho era idêntico.
Esperavam o fluxo dos carros diminuir para atravessarem uma rua importante, uma rua na qual muitos automóveis passavam a velocidades estonteantes. Alguns carros eram pequenos e guiados por rostos tristes que só se iluminavam qundo atingiam um transeunte desavisado. Outros grandes e repletos de rostos tristes que às vezes sorriam quando os veículos menores se chocavam e se destruíam.
Eram 3 tomates, mas poderia ser um só, talvez fossem um milhão de tomates idênticos a atravessar a rua. Logo morreriam atropelados, esmagados sob as rodas de um daqueles veículos super-potentes, afinal, não é para isso que são construídas as rodovias?
Quando fossem esmagados, ouviria-se um ruído surdo, "plof", "pluf","plef", na verdade 3 ruídos surdos. Surdas também seriam as risadas abafadas do motorista responsável pelos atropelamentos, mas talvez não fosse possível ouvir, porque os carros super-potentes têm sistemas de som ensurdecedores e vidros escuros, o que lhes confere um charmosíssimo tom impessoal.
Após o fim dos tomates nossas atenção se desviaria para algum outro evento cruel, desnecessário, grotesco e absurdo.

Friday, March 16, 2007

Enquanto meu mordomo, Mortimer, preparava-me um chá, me ocorreu um gracejo: O mundo parece-me demasiado embaçado sem meus óculos de aro de tartaruga, hi hi hi.

ESSE NÃO É UM BLOG AUTOBIOGRÁFICO, ORA.

Thursday, March 08, 2007

Grunge Is Not Dead

Beck, apesar de levemente idiotizado pela Cientologia, disse outro dia que o telefone celular já era. Eu digo aqui todo dia que blog é que nem banda de rock hoje em dia, ou seja, não faz a mínima diferença. POR QUE ESSA MERDA DE MONSTRO DE CASACO DE FLANELA RESISTE ENTÃO, CACETE?
Para entender o tamanho da merda, é necessária uma leve introdução ao estado das coisas por aqui. A maior parte da molecada que ouve rock no Brasil ainda é iniciada por aqueles tios esquisitões que tem vinis do Led Zeppelin, Deep Purple e Black Sabbath. Daí que não conseguimos sair dos anos 70 no Brasil. Os moleques ainda são hippies. Entram na universidade curtindo rock setentista - o que quer que isso signiffique para eles - e mpb engajada (ai, ai). Tomam as mesmas drogas que seus pais, e alguns até saem por aí lutando contra a ditadura.
A impressão que se tem, a julgar pelas camisas pretas dos adolescentes que passam por mim, ainda de casacos de flanela amarrados na cintura, é a de que os anos 90 só acrescentaram 2 nomes à iconografia do jovem roqueiro suburbano carioca: Kurt Cobain e Guns And Roses. Que tristeza. Vou até parar de falar, fiquei momentaneamente deprimido.

Tuesday, March 06, 2007

Ciranda Fim

Corria o boato na empresa de limpeza de que toda o pessoal seria substituído em breve e isso o incomodava como um espinho no olho. Já com uma certa nostalgia ele segura a barra de ferro que o une ao caminhão, descobrindo mais uma vez como ficam gostosas as coisas que sabemos que vão acabar para sempre. Romântico mesmo. Como quase sempre acontece com gente desse tipo, algo súbito acontece, para chacoalhá-los de seus delírios pueris inundados de auto-piedade: Uma freada brusca do caminhão quase o derruba.
O motorista solta um palavrão e logo ele percebe por quê. Estampada no asfalto a carcaça listrada de um gato. Ia ser preciso uma pá para tirá-lo de lá.

Ciranda 4

Ela era capaz de dizer só de olhar quem fazia do pael higiênico um embrulhinho quase inofensivo e quem jogava-o na cesta de qualquer jeito, às vezes até deixando pelo chão mesmo. Quem desenhava caralhinhos voadores e quem deixava telefones em ofertas de sexo bizarro. Quem lavava as mãos e quem passava melecas nas paredes. Após cinco anos, e só esse tempo, tornara-se avessa até ao toque de seu marido. Tinha um sonho recorrente em que se via vivendo numa bolha, como um garoto que uma vez viu num filme. No bolso do seu jaleco cinzento com o logotipo da firma para a qual trabalhava um bilhete escrito por ela mesma na sua letrinha de menina caprichosa do primário: "Comprar chumbinho". Ainda não decidira quais eram os mais nojentos, homens ou ratos. No caminho para casa pensaria nisso.
Seu marido também se olhava no espelho, outro , de outro banheiro. Não antipatizava com os ratos, nem com os homens. Às vezes se pegava rindo à toa, sem motivos, ainda que trabalhasse, como sua mulher, no ramo da limpeza, o que nos faz supor que o contato diário com o lixo tem efeitos diversos de indivíduo para indivíduo. Gostava do seu uniforme cor de abóbora, com a faixa branca fosforescente. Mas, acima de tudo, adorava sentir o vento na cara, enquanto passeava pela cidade, pendurado pelo lado de fora num caminhão de lixo. Ria dos amigos que tinham vergonha da profissão. Não era o máximo passar o dia correndo, sujo, quase livre com o vento batendo na sua cara? "Vergonha é roubar", dizia, acrescentando com uma risadinha, "E ser pego!".
Sem falar nas coisas interessantes que já havia encontrado no lixo. Desenvolvera o hábito de colecionar as que mais lhe interessavam, a saber, cartas de amor - que quando picotadas, o brigavam-no a um meticuloso trabalho arqueológico, juntando os pedacinhos, tentando organizá-los e colá-los em casa, sobre mesa da cozinha - e revistas pornô. Ele era um romântico. E aquelas coisas de amor acabavam no lixo. Ele preferia as coisas depois de gastas pelo uso, é verdade. Aplicava a todas as coisas da vida aquela lei universal de que os sapatos velhos são os mais confortáveis. E poderia-se dizer até que o excessivamente novo lhe causava um certo nojo.
CONTINUA

Ciranda 3

Ele adivinhou a cor errada. Pelo menos não tentou adivinhar o que ela pensava, porque passaria mais longe ainda. Dentro da cabeça da colega do banco e eventual parceira sexual do homem, o nome do homem figurava mais ou menos em décimo-terceiro lugar de uma lista que incluía uma nova tintura de cabelos cor chocolate, um par de sandálias de salto não muito alto, o novo regime, alguns acontecimentos recentes do mundo televisivo e, é claro, seu marido, pai de seus filhos, o homem da sua vida. Como amava aquele homem. Quanta felicidade ele lhe dava. Havia seu colega de banco, uma novidade divertida e excitante, mas com prazo estipulado de término para setembro próximo e nada mais.Nada sério. Amor era outra coisa para ela. Uma coisa que às vezes era grande demais e ela não sabia onde por, e que cansava, mas sem a qual não achava que pudesse viver. Ela só temia as coisas sérias demais. Ela sentia um cheiro de morte no ar quando não se podia mais rir. Ela lembrava de um funeral de um avô de quem ela não gostava por causa do seu cheiro e do seu bigode exagerado, e ela menina risonha tinha que prender o riso senão lhe chamavam a atenção. Seu colega de banco a deixava rir, principalmente quando nua.
Ainda era a menina? Ás vezes. Tudo passa tão rápido que nem sempre é possível acompanhar. Hoje, por exemplo, chegou tão rápido e ela ainda é a mesma de ontem. Ontem ela havia acordado às sete e meia da manhã para ver os desenhos animados na TV até o meio-dia, que era hora de ir para a escola. Pateta e Patolino ainda se faziam presentes nos adesivos colados em diferentes peças do seu material de trabalho, mas hoje era preciso muito mais concentração para se divertir. Seu nariz não parava de escorrer, o que fazia com que a lata de lixo sob a mesa começasse a transbordar de lenços de papel. Aliás, cadê a faxineira que não limpou essa sala hoje?
Ela não sabia, mas nós vamos saber. A responsável pela limpeza das salas ímpares do prédio estava por demais ocupada no banheiro, quase beijando o espelho sobre a pia. Descobrira uma mancha vermelha na testa, e, ainda que já houvesse descoberto um jeito perfeito de camuflá-la, com uma providencial puxada de franja, o incômodo persistia. Vira um filme há um tempo atrás em que um sinalzinho parecido era um fatídico sintoma de uma doença terrível. Tinha a certeza de que algo muito ruim aconteceria a ela, fosse a temível doença ou não, sempre tivera a sensação, desde que se lembrava. E qualquer que fosse o monstro que subia pelas suas paredes ocultas, sabia que essa sua profissão que a obrigava a remexer no lixo alheio não ajudaria em nada. Depois de cinco anos lidando com os dejetos dos outros, desenvolvera esse asco particular por gente. Olhava para eles e não conseguia deixar de pensar nos hábitos imundos de cada um nas suas intimidades.
CONTINUA

Ciranda 2

Então é importante que se saiba que os dois abraçariam a mulher bastante frequentemente, mas que raramente o fariam entre si, e quando o fizessem, seria com tal embaraço e falta de jeito, que mal se poderia chamar de abraço. O mais velho jamais veria o gato, mas concordaria com ele no que se refere às formas da mulher. O homem velho só não se incomoda tanto assim com aqueles quilos a mais da mulher, por causa do corpo bem mais magro de uma colega do banco que também abraça frequentemente. Ele também acha que facilita as coisas ter uma esposa que a cada dia fica com mais cara de "mamãe". Sentado à sua mesa, ele olha pela janela e vê a encosta ainda intocada de um morro e sabe que isso é quase um milagre na sua castigada cidade. Sorte dele que os castigos são para os outros, ele não nasceu mulher, nem cachorro, nem pobre. Ele tem uma mesa. E sorte.
Afinal era sorte que quanto mais envelhecesse, mais aumentasse seu sex-appeal,e, o melhor de tudo, acontecia o inverso com a mãe de seu filho. O homem gostava imensamente da sensação de poder. Os ponteiros do relógio na parede lhe sugerem que os outros dois terços da família da qual era chefe estariam juntos agora. E o moleque que não parava de engordar? Culpa da mulher, sempre sufocando-o, cercando-o de cuidados, com aqueles abraços longos e apertados que lhe deixavam com uma sensação esquisita. Quem sabe a natação desse um jeito no menino.
Os homens da sua família não eram gordos, a quem tinha puxado esse garoto? Entre os seus irmãos nãon havia nenhum gordo. Nem gay. Todos muito bem-sucedidos, obrigado. Homens destinados a terem mesas e salas com seus nomes escritos na porta, e casamentos estáveis, permeáveis a temporadas de infiltrações extra-conjugais, sem exageros emocionais inconvenientes. Olhou ao redor e teve certeza do seu sucesso, enquanto adivinhava a cor da calcinha da mulher sentada na mesa em frente.
CONTINUA
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